23.10.25

Eu sonhar, sonhar, sonhei… ('Lira' 3)






Homenageando a Rosalia de Castro




Eu sonhar, sonhar, sonhei,

a sorte nom era moita,

que nunca (delo me pesa)

fum meninha venturosa.

Sonhei como mal sabia

dando-lhe reviravoltas,

como fam os que pretendem

escapar da dolorosa.

Penalidades sofremos,

lástima de vida tola,

merecido tal castigo

polos pecados doutrora.

Aliás temos presentes

os nossos males de agora:

guerra, injustiça e traiçom,

a raça nunca melhora.

Mas aos poucos passeninho,

como quem nom quer a cousa,

fum sonhando esperançada

cumha existência nova.

Imaginei que seria

mais boniteira que a nossa,

bem mais alegre e riseira,

pacífica e primorosa,

desenhada por crianças

de almas puras e gozosas.

Salvaria-se o planeta

da nossa fétida impronta,

renascendo a primavera

e as estaçons tam fermosas,

sepultadas baixo o jugo

da lacra mais pavorosa.

Por fim cobiça esquecida,

convivência amorosa,

mais solidariedade,

e paz por riba de toda

primazia parcial: 

harmonia milagrosa! 

O sonho é realidade,

todo vira cor de rosa:

remoçada a humanidade,

o amor do mundo me afoga. 

Eu sonhar, sonhar, sonhei,

a sorte nom era moita,

mas que fazer, desgraçada,

se nom nacim venturosa!



by Eva Loureiro Vilarelhe





25.9.25

O silêncio mata







A colonizaçom é intrinsecamente genocida

lembremos tantos povos massacrados

terras despojadas de tantas vidas

despejadas por poderes taimados


O silêncio mata

e velaí está Gaza


Nunca esqueçamos: muçulmanos — negros

aborígenes australianos — nenos

ciganos — homossexuais — mulheres

sérvios — ucranianos — berberes 


O silêncio mata

e velaí está Gaza


E os governos assassinando à manda: 

Guatemala — Burundi — Darfur — Bósnia 

Colómbia — Bangladesh — Etiópia

Camboja — Timor-Leste - Ruanda


O silêncio mata

e velaí está Gaza


Matarom a maioria dos índios 

brasileiros — tibetanos — taínos 

americanos — uigures — arménios

ruaingas — ahmaras — curdos — assírios


O silêncio mata

e velaí está Gaza


Os judeus sofrerom o seu Holocausto 

—e os soviéticos e poloneses 

tamém romanis e deficientes—

mas negar a Nakba é —de facto— infausto


O silêncio mata

e velaí está Gaza


Os erros da história perpetrados

condenam sempre aos febles deserdados

alcemos a voz por todas as mortes

que unidos sempre seremos mais fortes


O teu silêncio mata

e serás cúmplice em Gaza



by Eva Loureiro Vilarelhe





13.8.25

Hesitante ('Figa' 6)






Disque dis e despois desdis

—Nom si? Ora nom, ora si!— 


Vítima vista vingativa

desatendida a negativa


Marcas pancadas traumas lágrimas

fornicada até polas ânimas 


Disque dis e despois desdis

—Nom si? Ora nom, ora si!— 


De pouco serve dizer nom

se vam com todo e sem perdom 


Adianta denunciar

se eles levam as de ganhar?


Disque dis e despois desdis

—Nom si? Ora nom, ora si!— 


Difícil decidir e o crime

cometido deixa-os livres


A nom ser que quadre a história 

sem falha dissuasória 


Disque dis e despois desdis

—Nom si? Ora nom, ora si!— 


Sempre estarei da tua parte

amiga mesmo que hesitante


Que atirem a primeira pedra 

quem sempre verdade dixera



by Eva Loureiro Vilarelhe





25.7.25

Renovar o plâncton ('Atlântidas' 6)







Quem for sereia a surcar mares

rios qual iara ou náiade

jogar coas ondas coma ondina

ou mai-d´auga uiara marina

dispor de engaiolante voz

faciana e corpo sedutor

para atrair àqueles homes

destrutores da vida síndrome

inequívoco do seu mal

caráter a erradicar já

desta sociedade banal


Sociedade crepuscular

—agoniante o capital—

só sustentável se mudar

e toda mudança começa

com umha revoluçom nesga

por onde há borbotar o sangue

desses homes por fim exangues

afogados por toda a parte

tingidos os rios e mares

de vermelho graças aos cantos

de sereia acabou o pranto


É hora de renovar o plâncton

nom dar comida aos peixes fartos

—esses ricos de pés calçados—

senom a espoliados pobres

que surcavam rios salobres

oceanos doutrora férteis

cos novos talentos versáteis

sementarei o mar de cadáveres

de genocidas dirigentes

da flor e a tona dos países

libertando-os de caciques



by Eva Loureiro Vilarelhe